segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Com Haddad, orçamento do MEC explode, mas qualidade do ensino piora

A revolta: As explicações não impediram os alunos de perder a paciência
A revolta
As explicações não impediram os alunos de perder a paciência

As três últimas tentativas de fazer um teste para alunos concluintes do ensino médio viraram caso de polícia. Mas esse pode ser o menor dos problemas do ministro da Educação, Fernando Haddad. No MEC de Haddad, a solução para todos os problemas é sempre a infusão de mais dinheiro público em uma máquina perdulária e incompetente. A marca do bom gestor é fazer mais com menos. Haddad é a antítese disso, pois, ao tempo em que o orçamento do MEC explodia, a qualidade do ensino piorava. O ministro gosta de vender como uma vitória da educação o fato de, nos últimos dez anos, o orçamento do MEC ter ido de 19 bilhões de reais para 69 bilhões de reais. Enquanto o dinheiro público jorrava, a qualidade do ensino no Brasil se deteriorava, conforme mostram os números dos levantamentos anuais do Sistema de Avaliação da Educação Básica. Em cinco do total de seis desses levantamentos fica evidente a queda de qualidade. É muito dinheiro para tão pouco resultado. Vejamos as razões disso. 
O programa do MEC de merenda escolar passou de 1,5 bilhão de reais em 2006 para 3,2 bilhões de reais neste ano. O gasto mais que dobrou, mas o número de alunos atendidos aumentou apenas 25% no mesmo período. 
O Enem é outro caso. A razão pela qual os problemas se repetem há três anos é que seu formato é um convite à falha. É inviável fazer apenas um teste simultâneo por ano, em todo o país, para selecionar os alunos das universidades federais. O MEC argumenta que a culpa do “acidente” deste ano foi a ação criminosa de um professor. Correto. Nenhuma atividade está livre da ação de criminosos. Mas a frequência com que ocorrem problemas no Enem desafia a paciência de alunos e pais de alunos. Desafia a inteligência entender por que o MEC não adota um sistema de aferições feitas em datas variáveis com base em um banco de questões com mais de 40 000 delas, de modo que possam ser montadas provas diferentes mas com a mesma capacidade de avaliação do aluno. Hoje, o banco de perguntas do Inep tem apenas 6 000 questões. A empresa que fez o pré-teste do Enem foi contratada sem licitação e cobrou quase sete vezes mais do que no ano passado. A previsão de gastos totais da prova para este ano é de 238 milhões — um custo de 45 reais por inscrito. Sabem qual foi o custo das eleições de 2010? 3,61 reais por eleitor. Ou seja, um doze avos do custo per capita do Enem. Apesar do baixo custo, os resultados das eleições saem no mesmo dia, e sem contestações judiciais de monta.
Outro programa inflado é o Prouni, que dá isenções fiscais às universidades particulares que concedem bolsas a alunos carentes. Por que razão o MEC precisa recorrer à iniciativa privada, que responde por cerca de 70% das matrículas do sistema de ensino superior, ignorando seu próprio sistema de universidades federais? Trombeteado como uma redenção, o programa atinge 250 000 alunos, o que representa apenas 1% da população brasileira em idade universitária. Apesar das lindas cerimônias de inauguração de universidades federais em locais inóspitos e dos bilhões de reais gastos anualmente para manter as escolas federais, elas continuam um reduto de pouquíssimos, respondendo por 15% do total de matrículas, ou 3% da população em idade universitária. 
Mais uma vez o que se tem são gastos elevados produzindo resultados pífios e um sistema que apresenta distorções inexplicáveis. Enquanto a relação aluno por professor é de 17 nas instituições privadas, nas universidades federais, é de apenas 10.  Essa diferença é didática. Uma maneira de expandir rapidamente o número de alunos nas universidades federais seria simplesmente abrir mais vagas e admitir mais alunos. Se um professor de universidade federal desse aulas para o mesmo número de alunos do seu colega da rede privada, a capacidade do sistema oficial de ensino superior praticamente dobraria quase sem custos para os pagadores de impostos, correto? Corretíssimo. Para isso, é preciso enfrentar as resistências corporativas das universidades federais — e isso o atual ministro não faz, pois comprar essa briga atrapalha seu projeto político. Haddad é um bravo apenas na hora de gastar dinheiro público e agradar às corporações.
Nove anos depois da queda do Muro de Berlim, em 1998, Haddad escreveu um livro intitulado Em Defesa do Socialismo. Naquele ano, o mundo experimentava já a explosão de produtividade trazida pela popularização da internet e a China já fazia o maior resgate de pessoas da miséria da história humana justamente por ter abandonado o socialismo. No livro, Haddad sustenta que a ideia de que uma pessoa comum possa ser capaz de escolher o que é melhor para si não passa de delírio. Para o socialista tardio Haddad, o povo só avança quando guiado por iluminados líderes socialistas. Escreve ele: “Ao invés de tomar o mercado como um provedor de sinais que indica ao capitalista o que os indivíduos desejam, visão fantasiosa do processo real, os cidadãos, através de seus representantes, devem encontrar uma forma de sinalizar os bens que desejam que sejam objetos de desejo”. Chama mais atenção a pobreza da sintaxe do que a indigência das ideias? É difícil responder. 
Haddad surpreende mesmo é em sua interpretação sobre a inovação tecnológica, chave do desenvolvimento. Ele não vê valor nela: “A atividade inovadora, ao contrário do trabalho qualificado, não produz valor. A internalização da ciência ao processo produtivo por meio da contratação, pelo capital, de agentes inovadores (...) não muda o fato de que, por exemplo, o ‘custo de concepção’ de uma nova mercadoria não se confunde com o ‘custo’, medido em trabalho social, de reproduzi-la industrialmente, que é a única medida do seu valor”. É um assombro. Na visão de Haddad, a ciência aplicada original e inovadora não tem valor, o que conduz à inevitável conclusão de que, para ele, a atual Era do Conhecimento é apenas mais um estágio decadente a ser superado pelo socialismo. Pela mesma visão, a educação — e a imprensa livre que dissemina o conhecimento produzido por ela — precisa ser controlada pelos líderes socialistas. Isso tudo nove anos depois de essas mesmas ideias terem causado a implosão do sistema soviético. Para ser justo temos que admitir que o ministro não deve mais rezar pela cartilha ideológica de seu livro de mais de duas décadas atrás. Mas ele não conseguiu reformular o ensino básico. Vai deixar os alunos brasileiros tão analfabetos quanto os encontrou. Seu maior êxito foi talvez o de instituir a obrigatoriedade do ensino de filosofia e sociologia (leia-se: a pregação esquerdizante) no ensino médio, para depois, em manobra diversionista que deixaria seus heróis de vinte anos atrás orgulhosos, reclamar do inchaço do currículo naquele nível. 
Gustavo Ioschpe é economista
Manoel Marques
Falta muito: Para a vida dos estudantes brasileiros melhorar efetivamente
Falta muitoPara a vida dos estudantes brasileiros melhorar efetivamente
Veja